A Solidão que se dissipa na Presença

O vento frio do outono varria as ruas estreitas da aldeia, levantando as folhas secas e trazendo consigo um cheiro nostálgico a terra molhada e a lenha queimada. A minha mãe, envolta no seu casaco de lã, caminhava com passos apressados pelo caminho de pedras que levava à casa da dona Maria. Sabia que aquela senhora, amiga inseparável da sua avó, já não tinha ninguém para lhe fazer companhia, e era seu costume, sempre que voltava às suas raízes, visitá-la e aquecer-lhe o coração por algumas horas.

Ao chegar à porta, bateu suavemente, como sempre fazia. Do outro lado, ouviu um leve arrastar de pés e, em seguida, o rangido da madeira antiga cedeu espaço para que a dona Maria aparecesse. O seu rosto marcado pelo tempo iluminou-se ao ver a minha mãe ali, como se, por um instante, a solidão se tivesse dissipado.

— Minha querida filha do coração, como é bom ver-te! — exclamou a dona Maria, abraçando-a com os seus braços frágeis, mas cheios de afeto.

A minha mãe sorriu, segurando as mãos frias da idosa, sentindo nelas a história de uma vida inteira. Entraram na casa de paredes brancas e móveis antigos, onde tudo parecia permanecer no tempo, menos o calor humano que, aos poucos, se foi esvaindo ao longo dos anos. O aroma a pão cozido no forno a lenha ainda se fazia presente, misturando-se com o cheiro de ervas secas penduradas na cozinha.

— Senta-te, querida, vou preparar um chá. — disse a dona Maria, apressando-se a mexer na chaleira, como se quisesse ocupar as mãos para esquecer o peso da ausência.

A minha mãe observou a pequena cozinha, que um dia estivera cheia de risadas e movimento. Agora, apenas os dois gatos ronronavam em cima da cadeira, observando com olhos atentos cada gesto daquela mulher que resistia ao tempo. Era impossível não sentir um aperto no coração ao vê-la ali, vivendo entre lembranças e promessas adiadas.

— Como tem passado, dona Maria? — perguntou a minha mãe, sentindo a necessidade de quebrar aquele silêncio que parecia gritar dentro da casa.

A dona Maria suspirou, olhando pela janela embaçada pelo vapor do chá.

— Ah, minha amiga, eu vou indo… O tempo passa, e a gente aprende a fazer companhia a si mesma. Os meus filhos dizem que me vêm visitar, mas o tempo deles corre mais rápido do que o meu – sorriu, com um olhar resignado. — Mas e tu? Conta-me as novidades.

A conversa fluiu entre recordações e confidências. A dona Maria falava sobre o passado como se ainda pudesse tocá-lo, relembrando as noites em que a sua cozinha estivera cheia de vozes, o cheiro das festas e as histórias compartilhadas à beira da lareira. A minha mãe ouvia atentamente, segurando a sua mão, oferecendo-lhe a única coisa que podia naquele momento: presença.

Quando a tarde já caía, tingindo o céu de tons alaranjados, a dona Maria segurou as mãos da minha mãe com ternura e, num tom sábio, deixou um conselho:

— Nunca abandones quem cuidou de ti com tanto amor, quem sacrificou os seus próprios sonhos para permitir que os teus nascessem. Não deixes para trás quem renunciou a tudo por ti, quem escolheu viver com menos para te dar mais, quem enfrentou noites insones só para ver o teu sorriso no dia seguinte.

A minha mãe sentiu um aperto no peito ao ouvir aquelas palavras. Eram verdades simples, mas profundas.

— E, se um dia aqueles olhos que antes brilhavam por ti se apagarem na névoa das lembranças, não tenhas medo. Se não te reconhecer mais, fica ali. Segura a sua mão, como ela fazia quando tu eras pequena, e aperta-a na tua. Não são necessárias palavras, nem explicações. Isso será suficiente.

A minha mãe baixou os olhos, emocionada. A dona Maria continuou:

— Porque o amor não precisa de memória para existir, e mesmo que a mente se perca, o coração lembrar-se-á sempre. O teu toque será a ponte para aqueles dias em que a vida dela girava em torno da tua e para aqueles abraços que eram o teu refúgio seguro.

O silêncio preencheu o espaço entre elas, mas não era um silêncio vazio. Era um silêncio carregado de compreensão e carinho. Antes de sair, a minha mãe prometeu voltar em breve. A dona Maria sorriu, com os olhos a brilhar de gratidão.

— Eu espero, minha querida. E, desta vez, tenho fé que cumpras a tua promessa.

A minha mãe saiu dali com o coração apertado, mas também com uma certeza: por mais que a vida corresse apressada, sempre haveria tempo para aqueles que nos amam. E prometeu a si mesma que voltaria, não para cumprir uma promessa, mas para garantir que a dona Maria nunca se sentisse completamente só.

Naquela noite, a dona Maria sentou-se na sua cadeira, entre os seus fiéis gatos, e, pela primeira vez em muito tempo, sorriu de verdade. Talvez no dia seguinte o telefone tocasse, talvez não. Mas naquele dia, pelo menos naquele dia, o vazio da casa tinha sido preenchido por uma amizade que o tempo não apagou.